1– O que representa,
no contexto da sua obra, o livro A Terceira Margem?
R – Oitavo
romance desde A Serpente de Bronze (1989), que anunciava a actual casa
comum europeia (desde 2004) e rastreava momentos altos da nossa História,
também expandida ao desastre de Alcácer Quibir, A Terceira Margem vai
além desse espírito viageiro cosmopolita e remitificação sebástica: debate o
fim da pena de morte em Portugal e, sobretudo, a abolição da escravatura no
Brasil, sem o que nações, comunidades e indivíduos não darão o salto para a
terceira margem, a da dignidade. Por outro lado, irmana-se, aqui, a vertente
regional, patente desde a estreia novelística (1980) até ao segundo romance, Torre
de Dona Chama (1994), nome da vila transmontana donde sai (além do autor,
além do narrador) a linha dos Cabrais que apelida a história entre 1756 e 2022.
Adequando o registo discursivo a tempos, lugares e personagens – algumas bem
conhecidas no imaginário luso-brasileiro, em que relevo Machado de Assis –, A
Terceira Margem é o título-síntese das minhas diligências literárias.
2 – Qual a ideia que
esteve na origem deste livro?
R – O narrador, Pedro
Álvares Cabral (1956), já comparecia naquele segundo romance, onde também
pesava a lembrança de um avô, agora, em A Terceira Margem, figura
central (1870-1966) e fonte de informação. Precisava de biografar um alter
ego e sua linhagem num período – século XIX, em particular – que, com a
independência política do Brasil, conduziu Portugal ao regime demo-parlamentar
de hoje, sem termos ainda chegado à plena independência dos indivíduos. Choca-me
que, sob formas várias, milhões de pessoas continuem a ser «mercancia», no
dizer do padre António Vieira. Sem debelar esta chaga – sendo solução Uma
Bondade Perfeita (2016), sexto romance –, a humanidade não é digna deste
nome. Lateralmente, na sequência de ficção histórica como O Romance do
Gramático (2011) e A Casa de Bragança (2013), faltava-me homenagear cerca
de dois séculos e meio, que melhor conheço, enquanto investigador universitário.
Era, também, outra forma de revisitar uma cidade de eleição, o Rio de Janeiro.
3 – Pensando no
futuro: o que está a escrever neste momento?
R – Donald Trump e
outros títeres inspiraram três novelas que se debruçam sobre o Poder – a
principal preocupação de 11 peças em 47 anos de Teatro, que acabo de
editar. Estão em retoques finais, à atenção de um futuro que se deseja mais
responsável.
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