sexta-feira, 4 de março de 2016

Museu da Língua Portuguesa



Historicamente, os Bragançãos, a par dos Sousas, constituem uma família estruturante do Reino: o derradeiro braganção, Nuno Mendes de Chacim, bisavô de Inês de Castro (e tendem os historiadores, cada vez mais, a casá-la com D. Pedro em Bragança, onde nasceu o segundo filho, D. João de Portugal e Castro), está sepultado no Mosteiro de Castro de Avelãs.
A riqueza dos falares, documentada em recolhas, do guadramilês ao barrosão, que beneficiaram, sobretudo, o riodonorês e, nos últimos 16 anos, o mirandês ‒ oficialmente, segunda língua nacional ‒, ganha muito com as relações transfronteiriças, em que concorrem os demais museus de Bragança.
Região felizmente conservadora do que importa aos etnógrafos e etnólogos ‒ hoje, antropólogos, musicólogos, etc., nacionais e estrangeiros ‒, em que os trabalhos e os dias se conjugam em expressões culturais e quadros linguísticos singulares, torna-se fácil carrear para um Museu da Língua materiais existentes ou inéditos, desde filmes sobre a região e autores a recolhas musicais ou cópia de papéis de José Leite de Vasconcelos depositados no Centro de Tradições Populares Manuel Viegas Guerreiro. Este, com a nova designação de grupo de Estudos de Tradições Populares, está integrado no Centro de Literaturas e Culturas Lusófonas e Europeias da Faculdade de Letras de Lisboa, centro que dirijo, onde temos grupos dedicados à África de língua oficial portuguesa e ao Brasil.
Projecto científico de escopo eminentemente pedagógico ‒ e, desde logo, seguramente visitado, como se percebe pela afluência estudantil ao Museu do Abade de Baçal e, mais do que estudantil, ao Museu Militar ‒, esta região, tradicionalmente ligada à emigração europeia, brasileira e africana, mas também à missionação, desde Quinhentos, tem oferecido ao País e à Língua, nestes seis séculos, nomes de respeito em várias frentes, como se prova em A Terra de Duas Línguas. Antologia de Autores Transmontanos (2011, 2013), volumes amplamente divulgados na Lusofonia.
Justifica-se, assim, um Museu da Língua Portuguesa, «projecto de extrema relevância para Bragança, que trará cá muita gente», como disse Hernâni Dias, presidente do município, em entrevista ao Mensageiro de Bragança (18-2-2016). Como estive na génese desta ideia, solicitado por Adriano Moreira há um ano, convém lembrar aos poderes públicos (Ministério da Cultura e Instituto Camões) esta precedência, quando outros, inspirados por um nefasto incêndio, se querem substituir ao Museu da Língua de São Paulo…
Com efeito, por iniciativa da Academia das Ciências de Lisboa, tivemos, em Fevereiro de 2015, na sede desta, uma reunião preparatória. Em Março, a mesma secção de Lexicologia e Lexicografia, sob a presidência do Professor Artur Anselmo, contou, já, com o presidente do Instituto Politécnico de Bragança. Em Junho e Julho, os académicos deslocaram-se a Bragança desde os citados a Telmo Verdelho, Fernando Sousa, etc. Em 4 de Setembro, constituiu-se, notarialmente, uma associação promotora do Museu, integrando a Academia das Ciências, o Instituto Politécnico e a Câmara Municipal. 
A Academia garante a matéria científica, o Instituto oferece um edifício e a Câmara responsabiliza-se pelas obras, candidatando-se a fundos comunitários. Acresce que, numa reunião em Bragança, interveio o anterior presidente autárquico, Jorge Nunes, agora bem situado, no Porto, na distribuição dos referidos fundos, e cuja experiência de 16 anos à frente da edilidade será muito útil.
O Museu ficou planeado no papel, à espera de futura arquitectura. Várias academias e outras instituições associaram-se. Houve, também, contactos junto de algumas personalidades. Constituídas as comissões executiva, científica e de curadores, falta aprontar o espaço físico, para que foi escolhido um antigo celeiro, de três torres, vistas de vários ângulos da cidade. Espero que esta ideia se concretize. Veiculei esta informação em mail para Ana Paula Laborinho, presidente do Instituto Camões, e minha colega na Faculdade de Letras de Lisboa. E noticiada, agora, pelo presidente do Executivo bragançano, deve criar-se um movimento de opinião pública que se espalhe ao país.

Jornal Nordeste (Bragança), 23-II-2016
  
    

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