Um vírus
atravessa continentes.
Tem incubação
lenta, como se
fosse este
poema. Não se trata
de morrer à
nascença, o que só
aos pobres
acontece. Nem é fome,
que alimenta
vidas de milhões.
Clima, poluição,
bombas, também
lhes fazem mal.
O nosso mundo,
todavia, é
outro. Treme, porque
um vírus mau, de
súbito, engana
quem não vê, não
quer ver, foi apanhado
na teia que lhe
dava mais-valias.
Assim, somos
milhões dentro de casa,
temendo-nos de
monstro invisível.
Os sem-abrigo
fogem para onde?
onde refugiados,
infelizes
de mundo que
julgávamos alheio?
Há um barco
somente, um dilúvio
geral,
distribuído por nós todos.
Gotículas que
matam serão nossa
respiração, se
dermos um abraço
a outrem, à
limpeza de mãos, à
higiene da alma.
Nesta rede,
cai oceano, não
um peixe triste.
Ninguém está
preparado para guerra
que se julgava
breve; mas subtil
é este inimigo:
mata menos
do que poluição,
onde se gasta
sem cuidar do futuro;
menos do
que fósseis
suicidas, ditaduras
de sorriso
lavado em petróleo.
Atinge-nos,
porém, sem ver a quem,
nessa cegueira
que se não distingue
do enlevo
narciso recriado
por uns tantos
senhores invisíveis.
Humanidade não é
isto, sim
um concerto de
vozes dissonantes,
com que um novo
tipo de progresso
tenha lugar. A
dor de uns é nossa,
cedo ou tarde.
Nada serve curto
prazo de gozo,
diluído em
seis, sete zeros
à direita, se
deixamos tudo,
nem memória fica.
Vive, poema,
quarentena grave,
té reverteres ao
Verão, ao Sol,
Ao Vento,
energias do porvir.
Não afastes do
centro brancos, negros,
onde devera ser
um arco-íris.
Precisa guerra –
combater um vírus,
que maldade,
inconsciência criam.
A vitória será
desigual, inda
aí; seja lição,
o egoísmo
turve-se, que em
pântano reflecte.
Quando a
História contar da pandemia,
veremos se há
números, se homens.
Resta louvar
quem, médicos e outros,
não olha ao quê,
age porque sim.
Humilhação: ou
mudas pra melhor,
ou virão novas.
Testes positivos
devem arrepiar humanidade.